quarta-feira, 12 de julho de 2017

UM DIA, UMA PRAÇA. A INTERVENÇÃO

UM DIA, UMA PRAÇA
A INTERVENÇÃO
Por Gilson Neves.







Com muito orgulho e satisfação, recebemos, na segunda metade do século passado, um honroso convite feito pelo então prefeito municipal Sr. Paulo de Tarso Furtado, por intermédio de seu filho Marcos Cosentino Furtado, também de saudosa memória, para reordenar e melhorar o verde cênico-paisagístico da principal praça da cidade de Rio Pomba, MG, conhecida como Praça Dr. Último de Carvalho.

Esse fato ocorreu logo após a impactante derrubada de todas as árvores conhecidas como Fícus benjamina, então dominante por toda área da praça, apresentadas em forma de arte topiaria e muito bem cuidadas por anos a fio, como exige o seu rigor na manutenção.

Arte essa oriunda dos famosos jardins de Versalhes, criada pelo famoso arquiteto paisagista André Le Nôtre, no tempo de Luis XIV.

Essa referida derrubada acredita-se que fora fruto daquele mau exemplo impiedoso e alardeado pelo massacre dos saudosos maciços de fícus benjamina da Avenida Afonso Pena, em Belo Horizonte, numa fatídica manhã de vinte de novembro de 1963.

Após o morticínio dos fícus da praça, ficava decretada a extinção por completo de um modelo típico de paisagem - arte topiaria - expressa pelos grandes e belos pórticos destacados em cada uma de suas entradas, retratando figuras geométricas, distribuídas ordenadamente por toda a área.

Um irreversível tipo de trato paisagístico que perdurara por anos a fio, com endosso de plena aceitação da população daquela época.

Após a mutilação, o que se podia conferir era a presença de poucas árvores e arbustos que milagrosamente escaparam da degola. Foram elas, os felícios, as rosas-da-venezuela, as palmeiras imperiais e as bananeiras-de-leque, que até hoje figuram no elenco vergel, como reminiscências de um episódio marcante.

Assim que a consultoria técnica foi contratada para revitalizar a praça, no intuito de adequar as melhores técnicas paisagísticas de recomposição cênica, transeuntes curiosos e com seus olhares intrigantes questionavam com certa margem de pouca compreensão às intervenções que estavam acontecendo ali, imaginando que a destruição da vegetação fora feita por nós. 

Com a nossa lida e acompanhamento habitual, as devidas instruções técnicas de remodelação da praça, muitas pessoas julgaram, erroneamente, sermos então os idealizadores da extinção daquela saudosa “arte topiaria” do lugar. Ledo engano! A praça sempre foi para nós uma referência muito especial e de amplo cunho afetivo. Tanto antes como agora.

Somos vanguardistas, sim! Devemos acompanhar o progresso com altivez. No caso dessa praça, não se argumentou decepar uma obra de arte para atender uma suposta mera vaidade, atitude característica de ego inflado. Sempre pautamos pelo bom senso e lógica em nossos trabalhos.

Então, fica a dupla vantagem dos usuários veteranos que ainda usufruem desse novo espaço de lazer e que, ao mesmo tempo, são capazes de descrever com maestria todo aquele visual nostálgico vivenciado no passado. Difícil aos neófitos entenderem realmente o que de fato aconteceu, ou seja, as metamorfoses ocorridas no espaço e no tempo.

Essa nova repaginada na praça permite, de forma positiva, contar com uma considerável melhoria na iluminação geral e inclusão de oito bancos contínuos, bem distribuídos para suprirem a demanda dos escassos bancos pequenos e desconfortáveis do passado. A supressão de dois canteiros centralizados possibilitou a criação de uma grande área livre, propícia para receber um maior número de usuários em ocasiões de eventos; os bloqueios visuais dos fícus deram lugar uma nova visão multidirecional de visadas, possibilitando melhor apreciação do coreto, da lateral da Igreja da Matriz e dos poucos remanescentes sobrados de entorno da praça.

OS PREPARATIVOS:
Para o novo visual da praça, os preparativos foram executados sem problemas, mesmo diante da negatividade, em termos de recursos financeiros, para tocar toda a obra; todos os quatro canteiros agigantados do lugar receberam a devida adubação orgânica e corrigida a alta acidez do solo; o papel preponderante da comunidade foi efetivo quanto à doações de mudas para serem reproduzidas em dois hortos especificamente criados para a devida multiplicação das mesmas. Os custos nessa empreitada foram quase zero, graças a mão de obra ter sido apenas elaborada pelos funcionários da prefeitura.

AS INTERVENÇOES:
NO CORETO | NOS CANTEIROS | NA BORDA DO LAGO|

Coreto
Implantação de jardineira envolvente ao coreto.
Justificativas.

Conforme já dito, com a reforma da praça, os horizontes centrípetos e circunspectos do passado foram disseminados, permitindo outra visão do espaço, nova imagem mais ampla da praça. Em conseqüência, o coreto centralizado ficara meio perdido e ilhado no espaço e daí, mais diminuto e tíbio na composição paisagística, por carecer de um embasamento visual que lhe permitisse aglutinar e imbricar estabilidade com volumetria. A brancura excessiva do piso de saibro reinante na vasta planura do lugar é cúmplice dessa nova imagem relatada.

Com o propósito de valorizar o seu todo plástico e ressaltar a estrutura artística da cobertura poligonal e beirais, optamos por implantar uma leve e discreta jardineira rasante, de 50 cm de altura por 70 cm de largura, contínua ao seu redor. Essa solução visa aumentar o volume plástico do coreto no contexto, ao permitir certa proporcionalidade e ajuste à bela leveza das abas poligonais do beiral.

NOS CANTEIROS:
Combate à poluição sonora | Instalação de deque | Implantação de monumento escultórico.
Justificativas.

O aumento exagerado da poluição sonora no espaço circundante da praça passou a reinar imediatamente após remoção dos arbustos compactos nos canteiros e dos pórticos volumosos dos ficus topiarios, servidores de barreiras.

Os altos decibéis provenientes dos sons emitidos pelo tráfego de veículos nas vias de entorno eram emanados e lançados às muralhas locais expressas pelas testadas dos sobrados coloniais, grudadas entre si e dispostas em forma de cinturão e que eram refletidos para o interior da praça, com intensidade maior devida a alta flexibilidade dos percursos sonoros, gerando desconforto aos usuários da praça, devido ao alto poder reverberante.

Baseado na física e em busca de uma melhor solução para minimizar o impacto sonoro, decidiu-se por bem, adotar a implantação de morrinhos ondulantes e gramados, em formato dinâmico - parabolóide-hiperbólico - que além de absorver os sons indesejáveis, pudessem dar à praça mais aconchego e paz, visual então inédito que incitasse algo de belo e diferente na paisagem, que contribuísse para contrapor a planura reinante da praça, dando ao espaço ritmos paisagísticos, livrando os usuários do barulho, nos momentos de deleite ao lugar, de forma serena com estímulo à sensação de tranquilidade e prazer.

Esse ineditismo, por sorte, ganhou força e serviu também para estender essa ideia de utilizar morrinhos em algumas praças de Belo Horizonte. No ensejo, por ter sido arquiteto e paisagista, resolveu-se adotar essa proposta em difundir ideias ecológicas na Praça Milton Campos - bairro Cruzeiro- zona sul da capital mineira que, por sinal, ainda vigoram, garbosamente firmes e revitalizadas.

NA BORDA DO LAGO – instalação de deque.

Para ver e sentir mais de perto os peixes e apreciar mais a brisa emanada do repuxo centralizado e estender-se mais para dentro do espelho d’água, adota-se uma plataforma “deque” de madeira ao lado direito do lago, em relação ao coreto. Esse local serviu por bastante tempo, de forma bastante especial, como ponto apropriado para tirar fotos de pessoas e crianças.
Com o perecimento da madeira, através do tempo, esse material não foi reposto.

NO CANTEIRO -Implantação de monumento.
Justificativa.

Para homenagear o político Último de Carvalho, que muito contribuiu para o progresso de Rio Pomba, não só como vereador, mas como deputado federal, a praça hoje tem o seu nome.

Como reconhecimento pelo estímulo e propulsão econômico e cultural da cidade, a população pediu que fosse idealizada a construção do monumento escultórico no recinto dessa área nobre e para isso, mais uma vez, fomos também convidados para elaborar essa tarefa. E com muita satisfação e agradecidos, idealizamos o projeto, levando-se em conta a premissa de fugir do corriqueiro padrão, dos costumeiros e pesados troncos de pirâmide, optamos por explorar formas leves e curvas que integrassem com outras presentes no recinto, buscando sempre interação harmônica entre bosque, relvado e arquitetura, sem agredir o verde intrínseco do lugar.

O PROJETO.
ARQUITETURA PAISAGÍSTICA:

- Três níveis: plantas domínio arbóreo, arbustivo e herbáceo.
O trabalho completo de paisagismo consta de doze grandes folhas ou pranchas; quatro para cada nível. A
mais complexa foi a de domínio herbáceo, em virtude da vasta legenda com nomes científicos das plantas de forração para atender a demanda de cobrir extensas áreas dos canteiros. Na época, havia muita variedade e pouca quantidade de plantas ornamentais para cobrir toda área dos canteiros, daí o recurso foi o de montar um projeto complexo, mais parecendo trabalho de neófito.

DOAÇÃO AO MUSEU HISTÓRICO DE RIO POMBA
Com o propósito de registrar, preservar, divulgar e perpetuar esse episódio aqui descrito a respeito dos fatos acontecidos durante a reforma da praça e, ao mesmo tempo, atendendo a pedidos, vimos por bem, doar ao Museu Histórico de Rio Pomba, uma pasta contendo cópias de doze pranchas do projeto de revitalização da praça; um detalhamento de piso premoldado proposto para área interna, caso viesse a ser pavimentado e um desenho artístico, a mão livre, feito a nanquim, elaborado e assinado por nós, baseado em fotografia aérea da praça, produzida no século passado, apresentada pelo então dirigente municipal e na pessoa do também saudoso Marcos Furtado.

CONVITE
Esse episódio aqui descrito mais detalhado pode ser complementado e visto em um documentário elaborado por nós, existente no YouTube, sob o título de RIO POMBA, MEMÓRIAS DE UMA CIDADE.

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